segunda-feira, 25 de julho de 2022

O lobo, o leão e o cachorro

 

    Farei, neste texto, uma relação entre uma pintura de Ticiano, a teoria de Aristóteles e a nossa vida. Preparados? Vamos lá!

    Começo pela pintura. Há uma pintura de Ticiano chamada "Alegoria da prudência", de 1560, que apresenta três animais e três homens, com idades diferentes. Jelson Oliveira, na obra A filosofia vai ao museu, apresenta a pintura da seguinte forma: as três cabeças dos homens representam a velhice, a maturidade e a juventude. A primeira seria o próprio pintor; a segunda, seu filho Orazio; a terceira, seu sobrinho Marco Vecellio. A primeira está virada para a esquerda, como se olhasse para o passado, para a direção contrária ao olhar do espectador diante do quadro. A segunda, está virada para a frente, para o presente de quem olha e pode, ao mesmo tempo, ser olhado pela figura central, embora ela desvie o olhar. A terceira olha para a direita, para o futuro de quem contempla o quadro. Os tons de luminosidade também variam da esquerda para a direita: a velhice está quase no escuro enquanto a juventude está toda iluminada. A direção dos olhares é proposital: o velho olha para baixo, o adulto para frente, o jovem para cima.

    Abaixo das cabeças humanas aparecem três cabeças animais: o lobo, o leão e o cachorro. O lobo, em muitas culturas, é o animal sábio, precavido, atento, intuitivo e solitário. Ele é o animal da noite. O leão é o animal da caça, da inteligência e da força. Ele é solar e simboliza o orgulho, representado pela sua realeza entre os animais. O cachorro, na Antiguidade, representava a vida eterna: o mais famoso deles era Cérbero, o guardião do portão do reino de Hades. Para que a prudência seja exercida, precisa destas três atitudes psicológicas: a memória do lobo, para lembrar das experiências passadas; a inteligência do leão, que julga o presente com eficácia; e a previdência do cão, que antecipa o futuro.

    Passo agora à teoria de Aristóteles. Na sua Ética a Nicômaco, ele trata da justa medida e do meio-termo. Segundo Aristóteles, a phronesis não é uma ciência ou uma técnica, mas uma sabedoria prática, cujo assunto são as coisas humanas. É uma disposição da mente que se ocupa com as coisas justas, nobres e boas para o homem e está relacionada à virtude e à capacidade de deliberar adequadamente o que é bom para cada um de nós, não em vista de algo particular, mas sobre aquilo que contribuem para a vida boa em geral.

    E qual é a relação de Ticiano e Aristóteles com a nossa vida? Os jovens, segundo Aristóteles, embora possam aprender coisas importantes do ponto de vista da ciência e da técnica, raramente seriam dotados de sabedoria prática: o motivo é que essa espécie de sabedoria diz respeito não só aos universais, mas também aos particulares, que se tornam conhecidos pela experiência. Ora, um jovem carece de experiência, que só o tempo pode dar. Aristóteles entende que um menino não pode se tornar filósofo (embora possa ser um bom matemático ou físico) porque a Filosofia (como sabedoria prática) não é uma abstração, mas diz respeito às decisões concretas da vida, às nossas ações. Por isso, os jovens devem prestar atenção aos ensinamentos dos adultos e buscar sempre a prática da prudência e da temperança, com o intuito de aprender a agir corretamente, o que significa fazer boas escolhas. Assim, o discernimento é o caminho para o alcance do bem.

    As três idades que aparecem na pintura de Ticiano são, na teoria de Aristóteles, representados pelo menino, que carece de experiência e pelo adulto e pelo velho, que devido a experiência, conseguem utilizar a sabedoria prática em suas vidas. E aqui está a relação com a nossa vida: devemos amadurecer e buscar, por meio da experiência, a phronesis. E ela é unicamente adquirida pelo hábito e pela prática.

Grande abraço,

Mateus Salvadori
 
Postagem: Odair José, Poeta Cacerense

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