O distanciamento cotidiano, visto pelo viés ético, se revela como um problema da responsabilidade para com o outro. Quando deixamos que a rotina nos absorva ao ponto de transformar as relações em meros contatos funcionais, negligenciamos o dever de reconhecer no outro não apenas uma presença útil, mas uma existência plena de dignidade e vulnerabilidade.
O distanciamento cotidiano é, em essência, um fenômeno da condição humana. Ele não se reduz à ausência física, mas revela o modo como nos relacionamos com o tempo, com o outro e, sobretudo, conosco mesmos. Quando a rotina se instala como hábito inquestionado, o olhar se embota, o diálogo perde densidade e a presença se torna mera função. A proximidade, então, deixa de ser experiência para se transformar em convivência mecânica.
A ética nos lembra que o outro não é apenas parte do cenário da nossa vida; ele é sempre um chamado. Cada gesto de atenção ou de descuido possui um peso moral, pois contribui tanto para a construção quanto para o esvaziamento da relação. O distanciamento cotidiano, portanto, não é neutro: ele mostra quando falhamos em sustentar a presença que prometemos, explícita ou silenciosamente, a quem está próximo.
Mas essa falha também pode ser um ponto de virada. Reconhecer o distanciamento não é apenas constatar uma ausência, é assumir a responsabilidade de recuperar o espaço da alteridade — de devolver ao outro a escuta, o olhar, a consideração. Nesse sentido, a ética é o antídoto contra a anestesia do hábito: lembra-nos que toda vida compartilhada exige cuidado, e que o cotidiano só se torna humano quando preserva, mesmo na repetição, a chama da atenção recíproca.
Reflexão: Odair José, Poeta Cacerense

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