Desperte!
Há um chamado silencioso embutido nessa palavra, quase um sacudir de ombros da própria consciência. Despertar não é apenas abrir os olhos pela manhã, mas recusar-se a atravessar o dia no piloto automático, como se a vida fosse um corredor estreito onde só resta caminhar até o fim.
A rotina, quando não questionada, tem um poder devastador. Ela se disfarça de segurança, de organização necessária, mas aos poucos vai arrasando a vida por dentro. Não porque repetir seja, em si, um mal — afinal, o coração também repete seus batimentos —, mas porque a repetição sem sentido, sem presença, transforma o viver em mera sobrevivência. O dia se torna igual ao anterior, não por harmonia, mas por ausência de escolha.
É nesse desgaste silencioso que a alma se cansa. Não de trabalhar, não de lutar, mas de não sentir. A rotina corrosiva rouba o espanto, anestesia o olhar e faz com que o extraordinário passe despercebido. O café quente, a luz da manhã, uma conversa banal: tudo vira ruído de fundo. E quando a vida vira ruído, algo dentro de nós começa a adoecer.
Por isso, renovar a alegria de viver não é um luxo nem um capricho emocional; é um ato de resistência. Toda manhã carrega a possibilidade de reabastecer esse reservatório invisível que sustenta o sentido de estar vivo. Não se trata de grandes revoluções, mas de pequenos gestos conscientes: mudar o caminho, escutar de verdade, permitir-se sentir — inclusive o cansaço, a tristeza, o tédio — sem deixar que eles definam tudo.
Despertar é lembrar que a vida não é apenas o que se repete, mas o modo como nos colocamos diante da repetição. É escolher, mesmo dentro do mesmo cenário, uma nova postura interior. A rotina pode existir, mas não precisa governar. Quando a alegria é renovada — ainda que em doses mínimas — a alma encontra fôlego para não se corroer.
Viver, afinal, não é apenas cumprir dias. É manter acesa, apesar do desgaste, a chama que diz: eu ainda estou aqui, e isso ainda importa.
Reflexão: Odair José, Poeta Cacerense

Nenhum comentário:
Postar um comentário