Os sábios sabem de tudo, mas não tudo. Há nessa afirmação um paradoxo que não diminui a sabedoria — ao contrário, a aprofunda. Saber de tudo não é possuir cada resposta, mas reconhecer os contornos do conhecimento: suas margens, suas sombras, seus silêncios. O sábio não é aquele que encerra o mundo em conceitos, mas o que caminha entre eles com humildade, consciente de que sempre restará algo que escapa, algo que não se deixa nomear.
É justamente nesse “não tudo” que a inspiração encontra morada. Ela não pede licença, não segue método, não obedece cronogramas. A inspiração chega como um sopro: atravessa frestas, invade momentos banais, se instala quando a razão baixa a guarda. O sábio sabe disso. Por isso, estuda, observa, escuta — mas também espera. Não a espera passiva, e sim aquela feita de atenção aberta, como quem deixa a janela entreaberta mesmo sem garantia de vento.
Há um limite onde o saber racional se curva. Livros, teorias e experiências constroem o chão, mas não o salto. A inspiração é o salto. Ela nasce do acúmulo, mas não se submete a ele. Pode surgir no excesso ou na falta, no silêncio ou no caos. E quando chega, não explica: apenas exige expressão.
Talvez a verdadeira sabedoria esteja em aceitar essa dança entre controle e mistério. Saber o suficiente para reconhecer padrões, e ignorar o bastante para ainda se surpreender. Quem acredita saber tudo fecha a porta; quem admite não saber tudo cria espaço. A inspiração, sensível a esses vazios, entra sem avisar — como se soubesse que só é possível visitar quem não tenta possuí-la.
Assim, o sábio não persegue a inspiração. Ele a honra. Trabalha todos os dias como se ela pudesse chegar a qualquer momento, e vive sabendo que, quando vier, será sempre inesperada. Porque aquilo que realmente importa — a centelha, o sentido, o gesto criador — jamais se entrega por completo ao domínio do saber.
Reflexão: Odair José, Poeta Cacerense

Nenhum comentário:
Postar um comentário