quinta-feira, 11 de novembro de 2021

E não sou uma mulher? - O discurso de Sojourner Truth

    Sojourner Truth, alcunha de Isabella van Wagenen, nasceu escravizada, nos Estados Unidos, em 1797. Em 1851, na condição de mulher negra livre, participou da Convenção do Direito das Mulheres em Akron, Ohio, nos Estados Unidos. 
 
    No momento em que participou dessa convenção, Sojourner Truth (em português, “verdade peregrina”) já era uma pregadora pentecostal conhecida. Na ocasião, ela fez um discurso inflamado para os presentes, entre os quais se encontravam sacerdotes que defendiam que as mulheres não deveriam ter os mesmos direitos que os homens, por acreditarem que elas eram fisicamente frágeis, menos capazes intelectualmente, porque Jesus era um homem e porque a primeira mulher, Eva, era uma pecadora. 
 
    Esse discurso é um documento histórico. Ficou conhecido como “E não sou uma mulher?”
 
Leia-o a seguir. 
 
    "Muito bem, crianças, onde há muita algazarra alguma coisa está fora da ordem. Eu acho que, com essa mistura de negros do Sul e mulheres do Norte, todo mundo falando sobre direitos, o homem branco vai entrar na linha rapidinho. 
    Aqueles homens ali dizem que as mulheres precisam de ajuda para subir em carruagens, e devem ser carregadas para atravessar valas, e que merecem o melhor lugar onde quer que estejam. Ninguém jamais me ajudou a subir em carruagens, ou a saltar sobre poças de lama, e nunca me ofereceram melhor lugar algum! E não sou uma mulher? Olhem para mim! Olhem para meus braços! Eu arei e plantei, e juntei a colheita nos celeiros, e homem algum poderia estar à minha frente. E não sou uma mulher? Eu poderia trabalhar tanto e comer tanto quanto qualquer homem – desde que eu tivesse oportunidade para isso – e suportar o açoite também! E não sou uma mulher? Eu pari treze filhos e vi a maioria deles ser vendida para a escravidão, e quando eu clamei com a minha dor de mãe, ninguém a não ser Jesus me ouviu! E não sou uma mulher? 
    Daí eles falam dessa coisa na cabeça; como eles chamam isso… [alguém da audiência sussurra, “intelecto”]. É isso, querido. O que é que isso tem a ver com os direitos das mulheres e dos negros? Se o meu copo não tem mais que um quarto, e o seu está cheio, por que você me impediria de completar a minha medida? 
    Daí aquele homenzinho de preto ali disse que a mulher não pode ter os mesmos direitos que o homem porque Cristo não era mulher! De onde o seu Cristo veio? De onde o seu Cristo veio? De Deus e de uma mulher! O homem não teve nada a ver com isso. 
    Se a primeira mulher que Deus fez foi forte o bastante para virar o mundo de cabeça para baixo por sua própria conta, todas estas mulheres juntas aqui devem ser capazes de consertá-lo, colocando-o do jeito certo novamente. E agora que elas estão exigindo fazer isso, é melhor que os homens as deixem fazer o que elas querem. 
    Agradecida a vocês por me escutarem, e agora a velha Sojourner não tem mais nada a dizer"
 
TRUTH, Sojourner. E não sou uma mulher? Tradução: Osmundo Pinho. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (Cachoeira)/University of Texas (Austin). Geledés.

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