O ser humano é, antes de tudo, uma manifestação visível do que carrega por dentro. Ainda que tente esconder-se sob máscaras sociais, sob a linguagem ensaiada ou os gestos domesticados, algo em sua presença sempre escapa ao controle — e revela. O corpo, os olhos, os silêncios, tudo fala. A manifestação externa é uma extensão da alma. A raiva disfarçada se insinua no tom da voz. A tristeza contida pesa no caminhar. A alegria verdadeira, por outro lado, não se pode fingir: ela pulsa, transborda, contagia.
Vivemos, muitas vezes, buscando parecer o que ainda não somos. Criamos imagens de nós mesmos como armaduras — confiáveis, admiradas, invulneráveis. No entanto, quanto mais nos afastamos do que sentimos verdadeiramente, mais o corpo se tensiona, mais os relacionamentos se tornam frágeis, mais a alma grita por dentro. A verdade é que o íntimo sempre encontra um caminho para se expressar. É como água: contida por um tempo, mas jamais para sempre.
Há uma sabedoria antiga que diz que o rosto, com o passar dos anos, se torna o retrato da alma. E isso não tem relação com beleza ou juventude, mas com a maneira como lidamos com o tempo. Quem cultiva a ternura cria traços serenos. Quem alimenta o ódio endurece o olhar. A vida se molda por dentro e por fora — e nenhuma maquiagem sustenta o peso de uma alma em ruínas.
Mesmo nossas palavras, quando não alinhadas ao que sentimos, soam ocas. O verdadeiro discurso não está na eloquência, mas na coerência entre o que se diz e o que se vive. A autenticidade, ainda que imperfeita, transmite uma beleza rara. Não é sobre expor tudo, mas sobre não viver em constante negação de si.
A transformação que importa é silenciosa e interior. Não se trata de decorar novas virtudes, mas de desatar os nós antigos. Perdoar. Reconhecer a própria sombra. Escolher a honestidade quando seria mais fácil mentir. Essa mudança, embora invisível aos olhos apressados, reflete-se inevitavelmente no modo como tocamos o mundo — com mais leveza, com mais compaixão, com mais verdade.
Somos aquilo que cultivamos no silêncio. E o mundo, como um espelho paciente, apenas nos devolve o reflexo do que somos por dentro.
Reflexão: Odair José, Poeta Cacerense

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